MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS DO ESTADO DO TOCANTINS
   

1. Processo nº:11564/2021
    1.1. Anexo(s)12529/2019
2. Classe/Assunto: 1.RECURSO
1.RECURSO ORDINARIO - REF. AO PROC. Nº - 12529/2019.
3. Responsável(eis):AGUIMON ALVES DA SILVA - CPF: 71148108149
4. Interessado(s):NAO INFORMADO
5. Origem:AGUIMON ALVES DA SILVA
6. Órgão vinculante:DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRANSITO
7. Distribuição:2ª RELATORIA
8. Relator(a) da decisão recorrida:Conselheiro JOSÉ WAGNER PRAXEDES

9. PARECER Nº 1458/2022-PROCD

Trazem os presentes autos a exame deste Ministério Público de Contas o Recurso Ordinário interposto pelo Sr. Aguimon Alves Da Silva, Diretor de Operação do Departamento Estadual de Trânsito – TO, em face ao Acórdão nº 844/2021-TCE/TO - 1ª Câmara, o qual julgou irregulares as contas decorrentes da Tomada de Contas Especial por conversão, nos termos da Resolução nº 610/2021 – TCE/TO.

Constata a tempestividade do recurso manejado (ev. 4) e sorteado o relator (ev. 7), seguiram os autos à Coordenadoria de Recursos para a devida manifestação.

A Coordenadoria de Recursos emitiu a Análise de Recurso nº 222/2022 (ev. 14), opinando pelo indeferimento do recurso, em razão da ausência de prescrição e em atenção ao princípio da dialeticidade.  

É o relatório, no necessário.

Inicialmente cabe informar que compete a esta Corte julgar as Contas prestadas pelos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelos Poderes Públicos estadual e municipal, e as contas daqueles que derem causa à perda, extravio ou irregularidades de que resultem prejuízo ao tesouro público, por força do disposto no art. 71, inc. II da CF/88, reproduzido no art. 33, inc. II da CE/89 e no art. 1°, inc. II da Lei n° 1284, de 17 de dezembro de 2001, e só por decisão desta Corte o Gestor pode ser liberado de suas responsabilidades.

Conceitua-se Tomada de Contas Especial, nos termos do art. 74, inciso III, da Lei Estadual nº 1.284/2001, como “a ação determinada pelo Tribunal ou autoridade competente pelo órgão central do controle interno, ou equivalente, para adotar providências, em caráter de urgência, nos casos previstos na legislação em vigor, para apuração dos fatos, identificação dos responsáveis e quantificação pecuniária do dano”.

Em análise aos autos, observa-se a instauração da Tomada de Contas Especial para apurar eventual violação da segurança da informação nos sistemas, especificamente no que concerne ao pagamento de taxas de serviços e/ou sanções nas atividades do Detran-TO, gerando um dano ao erário no total de R$ 2.054.217,89. Após os procedimentos de praxe, a comissão da Tomada de Contas Especial emitiu o Relatório nº 01/2021 (ev. 23).

Em sua defesa, os responsáveis sustentam, sem sede preliminar, prescrição em relação a respectiva demanda, nos termos do art. 206, §3º incisos IV e V do CC, bem como a ausência de responsabilidade do então Diretor quanto aos débitos baixados/cancelados no sistema.

No mérito, aduz em suma, que o montante baixado/cancelado foi devidamente justificado no sistema DETRANNET, além da sua impossibilidade em produzir provas, cujo ônus deveria ser atribuído ao órgão – Detran.

1 – Da preliminar de Prescrição

O Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 636.886/AL, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 24/06/2020, tema 899 (repercussão geral), sedimentou que é prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão condenatória do Tribunal de Contas, extirpando as controvérsias que remanesciam em torno da prescritibilidade das imputações de débito decididas pelas Cortes de Contas.

Nada obstante, o fato é que o caso concreto subjacente ao exame do Recurso Extraordinário em questão diz respeito à execução do título condenatório proveniente do Tribunal de Contas Estadual nos termos da Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais), razão pela qual aplicou-se, para fins de reconhecimento da prescrição da pretensão executória, o art. 174, do Código Tributário Nacional, que estabelece o lapso prescricional de 5 (cinco) anos para cobrança dos créditos da Fazenda Pública submetidos ao executivo fiscal. Confira-se, a este respeito, excerto retirado da ementa associada ao RE nº 636.886:

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL. EXECUÇÃO FUNDADA EM ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. ART. 37, §5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRESCRITIBILIDADE.

(...)

4. A pretensão de ressarcimento ao erário em face de agentes públicos reconhecida em acórdão de Tribunal de Contas prescreve na forma da Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal).

 Todavia, não se adentrou, naquela oportunidade, conforme se dessume do conteúdo do voto relator, sobre o regime legal de prescrição aplicável aos processos instaurados na esfera controladora (Cf. art. 20 da LINDB), é dizer, ao diploma normativo que rege a prescrição da pretensão punitiva ou reparatória exercida no âmbito específico dos Tribunais de Contas, mormente quanto aos marcos inaugurais, interruptivos e a prescrição intercorrente operada nos processos especiais de controle externo (v.g., na Tomada de Contas Especial), etapa que antecede a execução do Acórdão condenatório.

Referida lacuna, no entanto, embora reconhecida, não deve permitir concluir pela imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento operacionalizada mediante a Tomada de Contas Especial.

É da própria jurisprudência do STF que se extrai a aplicação da Lei nº 9.873/1999, no que concerne ao regime prescricional específico dos órgãos de contas, conforme ementa associada ao MS 32.201/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe. 21/03/2017, transcrita adiante:

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MULTAS APLICADAS PELO TCU, PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. EXAME DE LEGALIDADE.

1. A prescrição da pretensão punitiva do TCU é regulada integralmente pela Lei nº 9.873/1999, seja em razão da interpretação correta e da aplicação direta desta lei, seja por analogia.

2. Inocorrência da extinção da pretensão punitiva no caso concreto, considerando-se os marcos interruptivos da prescrição previstos em lei (no mesmo sentido: 2ª Turma: MS 35.512-AgR, DJe-135, 19/06/2019 e MS 36.067, DJe-234, 28/10/2019).

Adotando-se, pois, as premissas fixadas na Lei nº 9.873/1999 ao caso em apreço, observa-se a não ocorrência da prescrição. Para tanto, revela-se necessário considerar os seguintes parâmetros:

1.a) Do Termo Inicial e Prazo O art. 1º da Lei nº 9.873/1999 traz previsão explícita acerca do início do prazo prescricional:

Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado”. (g.n)

Nessa perspectiva, em dois casos o termo inicial da regra geral deixa de ser a data da prática do ato ilícito para ser o dia da cessação da infração (parte final do caput do art. 1º da Lei 9.873/99). Isso ocorre no caso de o ilícito ser permanente ou continuado.

Na hipótese em exame, tratando-se de um ilícito continuado, quando dois ou mais ilícitos da mesma espécie são realizados de modo similar, o prazo prescricional apenas começa a correr quando cessa a infração, isto é, quando o último ilícito é praticado.

À vista disso, estando presentes os requisitos para a contagem do prazo a partir da cessação da infração e considerando que a fiscalização compreende o período entre 2011 até 2017, tem-se como marco inaugural do lapso prescricional o último ilícito praticado (2017).

Logo, considerando o prazo prescricional de 5 (cinco) anos para apuração das infrações, resta afastada a hipótese de prescrição, haja vista que a instauração da TCE ocorreu no dia 30/06/2021 – Resolução nº 610/2021- 1ª Câmara.

Ademais, com vistas às exceções que atingem o próprio prazo quinquenal, seja para diminuí-lo, seja para estendê-lo ou substituí-lo, o caso em análise sofreu a incidência da interrupção prescricional.

1.b) Das Interrupções do Lastro Prescricional - Quanto à interrupção da prescrição, a citada lei contempla uma variedade de causas e a autonomia entre elas, sendo possível a multiplicidade de interrupções, conforme pronunciado pelo STF no MS 32.201. Confira-se, a este respeito, o teor do dispositivo, em ordem a que se permita visualizar a subsunção dos fatos abaixo descritos às hipóteses de interrupção, para fins de cálculo da prescrição:

Art. 2º. Interrompe-se a prescrição da ação punitiva:

I – pela notificação ou citação do indiciado ou acusado, inclusive por meio de edital;

II -  por qualquer ato inequívoco, que importe apuração do fato;

III – pela decisão condenatória recorrível;

IV – por qualquer ato inequívoco que importe em manifestação expressa de tentativa de solução conciliatória no âmbito interno da administração pública federal. (g.n)

Na interrupção do prazo prescricional administrativo, sempre que ocorrer um ato previsto no art. 2º o prazo prescricional quinquenal recomeçará a correr na sua integralidade, independentemente do prazo já transcorrido.

Com base nessa interpretação, é imperioso considerar que é apto para interromper o prazo prescricional o primeiro ato inequívoco de apuração, ou seja, quando realizado o primeiro ato (interruptivo) de apuração do fato supostamente irregular, abre-se novo prazo quinquenal, desta feita para que a autoridade administrativa promova a citação do responsável, que é o ato interruptivo cronologicamente posterior.

Assim, praticado o ilícito, a autoridade administrativa responsável pela apuração e punição terá cinco anos para iniciar a investigação, isto é, para praticar algum ato inequívoco que importe apuração do fato ilícito, fato que restou configurado com a instauração da inspeção, nos termos da Resolução nº 314/2017 – Proc. 12529/2019 (ev. 8).

1.c)  Da Prescrição Intercorrente

Conforme inteligência do art. 1º, §1º, da Lei nº 9.873/1999, opera-se a prescrição intercorrente se o processo ficar paralisado por mais de três anos, aguardando “julgamento ou despacho”. Trata-se, destarte, de prazo específico, não se aplicando o prazo geral de cinco anos. A finalidade da prescrição intercorrente, com seu prazo próprio, é a de assegurar a eficiência e celeridade nas apurações administrativas. Revelar-se-ia contrário a tal finalidade a paralisação injustificada do processo por período maior que o triênio estabelecido para a hipótese.

Do exame do trajeto processual percorrido nos autos da TCE, igualmente não se verifica a ocorrência da prescrição intercorrente, uma vez que o processo não ficou paralisado por mais de três anos aguardando “julgamento ou despacho”, na forma do art. 1º, §1º, da citada lei. As causas de interrupção elencadas abaixo permitem evidenciar que o processo teve andamento regular, especificamente o chamamento ao processo, com citação válida, opera a mora processual que interrompe a prescrição, dentre outros fatos interruptivos.

Por conclusão, à luz das considerações supra, a prescrição não restou operada no presente caso.

 

2 – Do Mérito

Prefacialmente, verifica-se que foram preenchidos os pressupostos gerais de admissibilidade recursais, destacados a legitimidade, interesse, tempestividade e cabimento. Os requisitos específicos do Recurso Ordinário –  fundamentos de fato e de direito e pedido de nova decisão (artigo 47, §1º, da LOTCE/TO e artigo 229, incisos I e II, do RITCE/TO) – também foram obedecidos, razão pela qual merece ser conhecido.

A controvérsia cinge-se na pretensão de reforma do Acórdão nº 844/2021 – 1ª Câmara, que julgou irregulares as contas e aplicou multa ao gestor em razão da seguinte infração:

3. O resultado encontrado considerou os débitos que sofreram alteração de 2011 a 2014 e que foram também cadastrados também nesse exercício em razão de que vários débitos dos anos anteriores terem sofrido a primeira alteração fora do período do escopo da auditoria (2011 a 2017). O primeiro passo dado para encontrar os débitos com indícios de “isenções” ilegais, no sentido amplo, foi retirar do resultado os débitos que apresentaram em algum momento de seu histórico de alterações uma observação em que fosse possível realizar rastreamento para justificar a operação, como um número de processo judicial ou um número de parecer técnico. Portanto, foram considerados dentro do resultado apresentado somente débitos não rastreáveis os quais assumiram um estado que representou a ausência de pagamento do débito sem que a operação tenha sido lastreada por algum documento ou justificativa. Outro ponto a ser destacado é que foram considerados os débitos cujos seus estados atuais à época da coleta na base de dados, tinham um estado diferente de pago, mas para verificar o momento da “isenção” e o usuário que realizou a operação, foi considerado, dentro do histórico de alterações do débito, a primeira operação realizada que modificou o débito para um estado em que representou a possibilidade a prestação do serviço sem efetivo pagamento pelo contribuinte ou a desnecessidade de pagamento de multas ou outras sanções. Todos os procedimentos realizados para filtrar os dados foram documentados e podem ser replicados. Para a contabilização da soma do dano gerado, foi utilizado o campo “Valor Vencimento”. É importante destacar que é possível identificar cada débito de maneira individualizada que integra o rol dos débitos não rastreáveis.

4. Por fim, a soma total dos débitos não rastreáveis encontrados após esta revisão do trabalho realizado foi de R$ 2.054.217,89 (dois milhões e cinquenta e quatro mil e duzentos e dezessete reais e oitenta e nove centavos). Esse é o valor total de dano ao erário, ocorrido durante o período de 2011 a 2014, sendo R$ 1.361.986,95 ocorrido em 2011, R$ 144.820,72, em 2012, R$ 285.863,38, em 2013 e R$ 261.546,84, em 2014.

Em suas razões recursais, o recorrente limita-se a reproduzir os mesmos argumentos e documentos já deliberados no âmbito do processo de tomada de contas especial, que versam, em suma, sobre a ausência de responsabilidade do então Diretor quanto aos débitos baixados/cancelados no sistema.

Ademais, sustenta que o montante baixado/cancelado foi devidamente justificado no sistema DETRANNET, além da sua impossibilidade em produzir provas, cujo ônus deveria ser atribuído ao órgão – Detran.

 2.1 – Do Princípio da Dialeticidade

Em todo o seu arrazoado, o recorrente se ateve unicamente a reiterar os contextos firmados em suas alegações de defesa ofertadas no expediente nº 8148/2021 (ev.50), acostado nos autos originários da Tomada de Contas Especial 12529/2019.

Para que[1] o recurso apresente-se formalmente regular, faz-se necessário que o insurgente impugne, de forma específica, as razões da decisão recorrida e que apresente novos argumentos capazes de lhe proporcionar posição de vantagem.

Essa necessidade de impugnação pontual das convicções contidas no decisum que se busca combater deriva do princípio da dialeticidade, postulado que traduz a ideia de que o recurso não deve apenas manifestar um mero inconformismo com o ato impugnado, mas também e necessariamente, indicar os motivos de fato e de direito pelos quais se requer um novo julgamento[2], motivos estes que não podem se resumir à mera reiteração de argumentos anteriormente apresentados[3].

O princípio da dialeticidade recursal impõe ao recorrente o ônus de evidenciar os motivos de fato e de direito suficientes à reforma da decisão objurgada, trazendo à baila novas argumentações capazes de infirmar todos os fundamentos do decisum que se pretende modificar, sob pena de vê-lo mantido por seus próprios fundamentos. (...) (g.f) (ARE 681888 AgR, Relator(a):  Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 10/05/2019, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-104 DIVULG 17-05-2019 PUBLIC 20-05-2019)

Com efeito, exatamente sob o aspecto da exigência de exposição dos motivos de fato e de direito no recurso, é que o princípio da dialeticidade mostra-se aplicável aos recursos interpostos perante este Tribunal de Contas, eis que se encontra subjacente ao art. 222 do RITCE/TO, comando que impõe ao recorrente o ônus processual de descrever as razões de impugnação sob aquele enfoque. Confira-se a redação do referido dispositivo legal:

Art. 222 – Os recursos serão formulados em petição, em que constem os fundamentos de fato e de direito e o pedido de nova decisão. (g.n)

No processo de tomada de contas especial, o Ministério Público de Contas exarou opinião pela irregularidade (ev. 54, proc. 12529/2019), em consonância com os entendimentos técnicos exarados pela douta Auditoria e Equipe Técnica (evs. 52 e 53).

Com efeito, a inexistência de fatos ou documentos novos torna inviável a rediscussão da matéria, devidamente abordada e decidida, em razão do princípio da dialeticidade. Mesmo que se adentrasse ao mérito, é incontroverso o fato de que o gestor não se desincumbiu da obrigação de comprovar a origem da baixa/cancelamento dos débitos junto ao sistema do DETRANNET, tendo em vista o ônus da prova negativa. 

Assim, em relação ao item diligenciado e ante a ausência de impugnação específica pelo recorrente, certo que a irregularidade apontada não pode ser considerada sanada e/ou elidida, permanecendo hígidas as conclusões exaradas no Voto condutor do Acórdão nº 844/2021 – 1ª Câmara.

2.2- Do ônus da Prova Negativa

O ônus da prova pode ser definido como o encargo, atribuído a uma das partes, de demonstrar a existência ou inexistência dos fatos controvertidos no processo, necessários para o convencimento do julgador

Nos processos referentes à comprovação de utilização regular de recursos públicos, prevalece o princípio da supremacia do interesse público, cabendo aos gestores a comprovação da regularidade na gestão dos valores públicos administrados.

A comprovação da regularidade da integral aplicação dos recursos públicos deve ser feita por meio de documentação idônea, que demonstre, de forma efetiva e inequívoca, os gastos efetuados e o nexo de causalidade entre as despesas e tais recursos.

A jurisprudência pacífica do Tribunal de Contas da União (Acórdãos 162/2004, 129/2004, 94/2004, 61/2004, 1996/2007 e 1351/2018), firmou-se no sentido de que, nos processos de tomadas e prestações de contas, ocorre inversão do ônus da prova, cabendo ao gestor dos bens e recursos públicos comprovar sua boa e regular aplicação.

 Por outro lado, nos processos decorrentes de fiscalização, não ocorre essa inversão, cabendo aos agentes do Tribunal o ônus da prova das práticas ilícitas que imputam aos responsáveis, haja vista que “quando estão produzindo acusações, submetem-se, em obediência ao devido processo legal, ao dever de provar (ressalvada a hipótese tratada no art. 93 do Decreto-lei 200/67 e, em certos casos, das chamadas provas negativas que não permitam, por sua natureza, a produção de prova material)” (Acórdão TCU n° 495/2008 - Plenário).

No que concerne ao trabalho de fiscalização realizado, a equipe designada desvencilhou-se do ônus que lhe competia, uma vez que foram trazidas aos autos provas para confirmar os indícios de atos danosos ao erário (baixa/cancelamento de débitos), razão pela qual, o Plenário deste Tribunal acolheu integralmente o relatório elaborado pela equipe responsável (Resolução 610/2021) e autorizou as citações propostas, assim como a formação de processos apartados de tomada de contas especial.

De seu turno, já em sede de tomada de contas especial, cabia ao responsável ouvido nos autos, os quais administraram os recursos impugnados pela equipe de auditoria, fazer prova de sua boa e regular aplicação, o que, de fato, não ocorreu, haja vista que não foram afastados os indícios de irregularidades destacados durante a execução da fiscalização.

Com efeito, as alegações de defesa apresentadas pelo responsável sequer tangenciaram tais indícios, os quais se converteram em prova do dano ao erário, tese que encontra guarida no entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 68.006 - MG, no sentido de que 'indícios vários e concordantes são prova'.

Destarte, como os argumentos apresentados pelo recorrente limitam-se aos já analisados em sede da tomada de contas especial, evidenciam-se insuficientes para ensejar prolação de nova decisão diversa da recorrida.

Por fim, reprisa-se que a obrigação de prestar contas é inerente do gestor público, portanto a quem cabe o ônus da prova:

                                    “O dever de prestar contas é decorrência natural da administração como encargo de gestão de bens e interesses alheios. Se o administrar corresponde ao desempenho de um mandato de zelo e conservação de bens e interesses de outrem, manifesto é que quem o exerce deverá contas ao proprietário. No caso do administrador público, esse dever ainda mais se alteia, porque a gestão se refere aos bens e interesses da coletividade e assume o caráter de um múnus público, isto é, de um encargo para com a comunidade. Daí o dever indeclinável de todo administrador público – agente político ou simples funcionário – de prestar contas de sua gestão administrativa, e nesse sentido é a orientação de nossos Tribunais (RT 237/253)” (Direito Administrativo Brasileiro, Hely Lopes Meirelles, pág. 92)

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas manifesta-se pelo conhecimento do presente Recurso Ordinário, por ser próprio e tempestivo, e no mérito, negar-lhe provimento, mantendo-se incólume os termos do Acórdão nº 844/2021 – 1ª Câmara.

É o Parecer.

MARCOS ANTONIO DA SILVA MODES

Procurador de Contas

 

[1]  DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil: Vol. 3: o processo civil nos tribunais, recursos, ações de competência originária de tribunal e querela nullitatis, incidentes de competência originária de tribunal. Salvador: juspodivm, 13ª ed. refom., 2016, p. 124.

 

[2] Cf. NERY JR., Nelson. Teoria Geral dos Recursos, 6ª ed., cit., p. 176/178.

 

[3] BUENO, Cássio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2008. vol.  V.  p.  30/31

MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS, em Palmas, aos dias 09 do mês de novembro de 2022.

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MARCOS ANTONIO DA SILVA MODES, PROCURADOR (A) DE CONTAS, em 09/11/2022 às 14:05:02
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